quarta-feira, outubro 13, 2010

ESTADÃO --> Editorial: O mal a evitar - Estadao.com.br http://www.estadao.com.br/noticia_imp.php?req=geral

setembro de 2010 | 17h 02

 

 

A acusação do presidente da República de que a Imprensa "se

comporta como um partido político" é obviamente extensiva a

este jornal. Lula, que tem o mau hábito de perder a

compostura quando é contrariado, tem também todo o direito

de não estar gostando da cobertura que o Estado, como quase todos os órgãos de

imprensa, tem dado à escandalosa deterioração moral do governo que preside. E muito

menos lhe serão agradáveis as opiniões sobre esse assunto diariamente manifestadas

nesta página editorial. Mas ele está enganado. Há uma enorme diferença entre "se

comportar como um partido político" e tomar partido numa disputa eleitoral em que

estão em jogo valores essenciais ao aprimoramento se não à própria sobrevivência da

democracia neste país.

 

Com todo o peso da responsabilidade à qual nunca se subtraiu em 135 anos de lutas, o

Estado apoia a candidatura de José Serra à Presidência da República, e não apenas pelos

méritos do candidato, por seu currículo exemplar de homem público e pelo que ele pode

representar para a recondução do País ao desenvolvimento econômico e social pautado

por valores éticos. O apoio deve-se também à convicção de que o candidato Serra é o que

tem melhor possibilidade de evitar um grande mal para o País.

 

Efetivamente, não bastasse o embuste do "nunca antes", agora o dono do PT passou a

investir pesado na empulhação de que a Imprensa denuncia a corrupção que degrada seu

governo por motivos partidários. O presidente Lula tem, como se vê, outro mau hábito:

julgar os outros por si. Quem age em função de interesse partidário é quem se

transformou de presidente de todos os brasileiros em chefe de uma facção que tanto mais

sectária se torna quanto mais se apaixona pelo poder. É quem é o responsável pela

invenção de uma candidata para representá-lo no pleito presidencial e, se eleita, segurar o

lugar do chefão e garantir o bem-estar da companheirada. É sobre essa perspectiva tão

grave e ameaçadora que os eleitores precisam refletir. O que estará em jogo, no dia 3 de

outubro, não é apenas a continuidade de um projeto de crescimento econômico com a

distribuição de dividendos sociais. Isso todos os candidatos prometem e têm condições de

fazer. O que o eleitor decidirá de mais importante é se deixará a máquina do Estado nas

mãos de quem trata o governo e o seu partido como se fossem uma coisa só, submetendo

o interesse coletivo aos interesses de sua facção.

 

Não precisava ser assim. Luiz Inácio Lula da Silva está chegando ao final de seus dois

mandatos com níveis de popularidade sem precedentes, alavancados por realizações das

quais ele e todos os brasileiros podem se orgulhar, tanto no prosseguimento e aceleração

da ingente tarefa - iniciada nos governos de Itamar Franco e Fernando Henrique - de

promover o desenvolvimento econômico quanto na ampliação dos programas que têm

permitido a incorporação de milhões de brasileiros a condições materiais de vida

minimamente compatíveis com as exigências da dignidade humana. Sob esses aspectos o

Brasil evoluiu e é hoje, sem sombra de dúvida, um país melhor. Mas essa é uma obra

incompleta. Pior, uma construção que se desenvolveu paralelamente a tentativas quase

sempre bem-sucedidas de desconstrução de um edifício institucional democrático

historicamente frágil no Brasil, mas indispensável para a consolidação, em qualquer

parte, de qualquer processo de desenvolvimento de que o homem seja sujeito e não mero

objeto.

 

Se a política é a arte de aliar meios a fins, Lula e seu entorno primam pela escolha dos

piores meios para atingir seu fim precípuo: manter-se no poder. Para isso vale tudo:

alianças espúrias, corrupção dos agentes políticos, tráfico de influência, mistificação e,

inclusive, o solapamento das instituições sobre as quais repousa a democracia - a começar

pelo Congresso. E o que dizer da postura nada edificante de um chefe de Estado que

despreza a liturgia que sua investidura exige e se entrega descontroladamente ao

desmando e à autoglorificação? Este é o "cara". Esta é a mentalidade que hipnotiza os

brasileiros. Este é o grande mau exemplo que permite a qualquer um se perguntar: "Se ele

pode ignorar as instituições e atropelar as leis, por que não eu?" Este é o mal a evitar.

 

Texto publicado na seção "Notas e Informações" da edição de 26/09/2010

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