Ecad: Jards Macalé e Antonio Adolfo comentam as denúncias que rondam os direitos autorais dos músicos do país
Plantão | Publicada em 22/05/2011 às 08h21m
Chico Otavio, Cristina Tardáguila e Leonardo Lichote
Rio - Em meio às denúncias de descontrole administrativo que, há um mês, rondam o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad), dois compositores de peso resolveram pedir a palavra. Em comum, Jards Macalé e Antonio Adolfo têm a visão de que a entidade que recolhe e paga os direitos autorais de todos os músicos do país e que, só em 2010, arrecadou R$ 433 milhões precisa ser saneada, mas não extinta. Apostam ainda que a fiscalização do órgão deve ser feita pelos próprios músicos e que o governo deve assistir a tudo isso bem de longe. Ontem, o GLOBO denunciou uma série de irregularidades no Ecad - de déficit que vira superávit a bailes de carnaval em que são tocadas apenas músicas de um compositor, passando por vales-refeição emitidos em nome de funcionários já demitidos e embolsados por terceiros.
Sentado na sala de sua casa, Jards Macalé sobe o tom quando comenta a situação. Deixa entrever uma mágoa com a falta de transparência que, segundo ele, vigora no sistema que ajudou a montar. Na década de 1970, Macalé foi um dos pilares da constituição da Sombrás, associação de músicos que hoje compõe a assembleia geral do Ecad ao lado de outras oito, agora com o nome de Amar Sombrás.
- O que falta nessa história é aquela velha pergunta do Noel Rosa: "Onde está a honestidade?" - diz o compositor, incomodado no sofá. - As pessoas estão roubando descaradamente, sujando até meu sobrenome.
Excesso de sociedades
Macalé, assim como a família mineira que está sendo auditada pelo Ecad por ter registrado como sendo suas mais de 600 músicas homônimas a grandes hits nacionais, também tem sobrenome Silva.
- Quer ver coisa pior do que você lutar para criar um negócio e ver esse negócio virar bagunça? Ver seu dinheiro sendo levado? - questiona. - Mas não quero o fim do Ecad. Quero só que ele seja limpo. E a limpeza não é uma questão do Ministério da Cultura (MinC), mas de Polícia Federal, Ministério Público...
Macalé critica também o que classifca como um excesso de sociedades arrecadadoras correndo atrás de um mesmo direito.
- Em países onde as questões autorais são levadas a sério, existem duas sociedades para as pessoas poderem escolher entre uma ou outra. No Brasil são nove! Um é pouco, dois é bom, mais que isso é demais - acredita.
Perguntado sobre o tamanho do problema gerado pelo Ecad em seu bolso, Macalé ri:
- Leio no jornal esses negócios de milhões para lá, bilhões para cá, com Microsoft, Google, Twitter, em transações que, na verdade, vendem conteúdo. Esse conteúdo somos nós - enfatizou. - Quem paga esse direito autoral?
Com sua crítica, Macalé não pretende pôr rédeas à internet - e ainda confessa que aprendeu a tocar "Corcovado" vendo João Gilberto no YouTube.
- Mas não estou achando saudável a forma como a discussão sobre direito autoral está se dando. Acho que só tem que disponibilizar sua obra na internet quem quiser - pondera.
Se estivesse ao lado de Macalé, Antonio Adolfo teria balançado a cabeça em concordância com ele inúmeras vezes.
O problema é que as associações de músicos não mostram competência suficiente para fiscalizar o Ecad e dão espaço para essa conversa de que outros órgãos deveriam fazer esse serviço
Por telefone, de Miami, o compositor que se destacou na música nacional como um dos primeiros do país a lançar um disco independente dispara:
- Não se pode obrigar ninguém a se filiar a uma associação para receber seu dinheiro. Mas se nós, músicos, não nos associamos a uma das nove que compõem o Ecad, não recebemos pela execução pública de nossos trabalhos. Como fica isso? É um absurdo.
Adolfo, que divide seu tempo entre as escolas de música que fundou no Rio e em Miami, ainda aposta no sistema de arrecadação e distribuição brasileiro. Acha que ele ainda tem tudo para dar certo e confia na gestão coletiva.
- A falta de fiscalização, no entanto, deteriora tudo e facilita o trânsito dos que nos surrupiam o pouco que conseguimos. Podem mudar as leis, os personagens, tudo isso... Mas, se não houver fiscalização, continuará tudo igual.
Há semanas paira sobre o Ecad e músicos brasileiros o fantasma de uma possível fiscalização governamental. O MinC já se posicionou favorável a uma supervisão da entidade. O assunto aparece até no projeto de lei que o ministério enviará ao Congresso até a metade do ano. Nem Macalé nem Adolfo admiram a ideia. Na verdade, entortam o nariz.
- O problema é que as associações de músicos não mostram competência suficiente para fiscalizar o Ecad e dão espaço para essa conversa de que outros órgãos deveriam fazer esse serviço. Aí vem o governo - explica Adolfo. - Não descarto a intervenção pontual dos órgãos públicos, mas isso só deve acontecer quando for requerido pelos músicos.
Se Macalé estivesse ao seu lado, teria assentido com a cabeça em concordância na hora.
Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/cultura/mat/2011/05/21/ecad-jards-macale-antonio-adolfo-comentam-as-denuncias-que-rondam-os-direitos-autorais-dos-musicos-do-pais-924510059.asp#ixzz1N8izCfWf
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